Antonio Fagundes mergulha de cabeça no cinema com o projeto Maldito Benefício, comédia que ele produz com o dinheiro do próprio bolso, o que ele confessa ser "um risco monstruoso". O longa tem roteiro e direção de Leonardo Cortez (Down Quixote), e foi o escolhido, após anos de procura, como o projeto com o qual Fagundes testará um modelo de produção que usa há mais de 50 anos em suas produções teatrais.
Em entrevista ao O GLOBO, Antonio Fagundes falou sobre sua mais recente incursão no cinema. Maldito Benefício é uma comédia que joga luz sobre à burocracia e corrupção brasileiras. No longa, o ator vive Nelson, um idoso de baixa-renda que espera há tanto tempo por um transplante que se encontra à beira da morte. Ele aguarda um bom dinheiro da Previdência Social, o benefício seria milagroso para a situação financeira da família, mas só será pago dali a sete meses, e pode ser que Nelson não esteja mais vivo. Até que ele traça um plano caso venha a falecer antes do pagamento: simples, congela-se então o seu corpo para depois descongelá-lo no momento de receber o 'maldito benefício'.
Um outro modelo
A produção é tida pelo próprio Fagundes como um teste, em termos de modelo de produção. Ele importa a forma como faz teatro há muitos anos, contraindo dívidas e colocando o projeto de pé com o próprio dinheiro, para depois comercializar as peças, que devem pagar o que foi gasto. "Fiz dívidas (risos). Desde 1975 apostei nas minhas peças, consigo colocá-las no mercado de forma que se paguem e atendam as necessidades do público, sem abaixar o meu nível artístico e cultural."
Fagundes expõe as dificuldades de concretizar obras culturais no Brasil em um tempo razoável: "Um dia me perguntei como se faz cinema no Brasil e descobri que é o mesmo processo que as pessoas produzem teatro no Brasil: submetem o projeto ao órgão federal, esperam aprovação e a partir daí, busca-se uma empresa que dê o dinheiro. Claro que o patrocínio é urgente e necessário, especialmente em um país que não tem política cultural de Estado, em que as diretrizes sobre a cultura variam de governo para governo. Mas esta é uma jornada que pode levar quatro, cinco, seis anos."
Maldito Benefício tenta driblar a burocracia e a espera angustiante da resposta de privados que concordem em conceder parte dos impostos à cultura. Desde que descobriu o roteiro de Leonardo Cortez até o início das filmagens, decorreram apenas dois meses.
Distribuição e exibição
Fagundes pontua que os problemas da indústria cinematográfica no Brasil vão muito além do financiamento: "São cerca de 3 mil salas de cinema em todo o país. Nos Estados Unidos são 50 mil. Os Estados Unidos produzem cerca de mil filmes por ano, no Brasil beiramos os duzentos. E mal conseguimos exibir os nossos filmes, porque a produção estrangeira ocupa pelo menos dois terços das salas. No outro terço que sobra, a gente consegue colocar nosso 'filmezinho' por uma, duas semanas. Temos que ter uma cota de tela para garantir a exibição do cinema nacional. Mas isso não é suficiente." Uma vez concluído o filme, o ator deverá enfrentar todos os obstáculos na distribuição e exibição da obra.
Quando questionado sobre como subverter essa lógica do mercado, o ator confessa: "Não tenho a menor ideia! Estou correndo um risco monstruoso. (risos) Mas ao menos estou tentando trazer para o cinema um modelo onde o risco existe. Sei que há potencial de mercado internacional, de circular o filme em festivais importantes, isso chama atenção dos distribuidores."