O terror que se abateu sobre o povo Osage no início do século XX, em Oklahoma, foi contado por David Grann, escritor reconhecido e jornalista colaborador da The New Yorker, em seu Assassinos da Lua das Flores. Após encontrar petróleo em suas terras, a Nação Osage viu o seu território receber centenas de brancos à procura de uma fatia do lucro do ouro-negro e sua população ser acometida por uma série de assassinatos. O livro de não-ficção, lançado em 2017, levou alguns anos para ser adaptado para o cinema, mas finalmente chegou às telonas pelas mãos do grande Martin Scorsese.

Em uma entrevista à Entertainment Weekly, Grann comentou sua perspectiva sobre o filme e o que aprendeu durante a escrita do livro. Desde o início, a intenção de Grann foi iluminar uma parte esquecida da história norte-americana, que era pouco conhecida pela maioria população. "A parte mais gratificante de assistir e seguir essa jornada é ver essa história irradiando para o mundo, ver as pessoas iniciando conversas sobre ela e preenchendo o que muitos americanos realmente extirparam de suas consciências."

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Killers of the Flower Moon © Paramount Pictures

Livro e roteiro

Com um convívio intenso e uma série de entrevistas com membros da Nação Osage, inclusive descendentes das figuras centrais do caso, o escritor compilou uma obra que oscila entre três pontos de vista: primeiramente, de Mollie Burkhart (interpretada por Lily Gladstone no filme), depois da própria investigação levada a cabo pelo FBI e, posteriormente, uma visão da atualidade e dos próprios descendentes que revela as falhas dessa investigação.

Martin Scorsese e Leonardo DiCaprio já comentaram sobre a dramática mudança que o roteiro de Assassinos da Lua das Flores sofreu. A versão inicial contava a história tendo a investigação do FBI como central, mas por questões criativas, o projeto acabou elegendo Mollie Burkhart e sua relação com Ernest como foco. Pela perspectiva de Grann, foi o bom caminho: "Eu acho que focar nesse relacionamento foi a decisão certa, porque essa relação também é muito representativa dos crimes que aconteceram. Se você conseguir entender um pouquinho esse relacionamento, você pode começar a compreender o que aconteceu em um nível macro."

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Killers of the Flower Moon © Paramount Pictures

"Uma campanha sistemática de assassinatos"

O que é mais chocante ainda sobre a história do genocídio do povo Osage é o quão recentes são os acontecimentos, que remontam a apenas uma ou duas gerações. "Realmente ainda reverbera até hoje." E há um ponto fundamental que Grann deseja que as pessoas entendam: "(…) quando eu comecei a fazer as pesquisas para o livro, eu pensei que uma figura maligna individual havia cometido todos esses crimes. Foi William K. Hale que executou, com o seu sobrinho Ernest e outro capanga. Eu acreditei nisso, pois essa foi a teoria que o FBI apresentou, e essa era a versão da história amplamente aceita."

Porém, a realidade era maior do que este cenário. "Quanto mais pesquisas eu fazia e à medida que fui conversando com os anciões Osage, eles compartilhavam comigo histórias e registros sobre outros assassinatos em suas famílias, outras mortes suspeitas que nunca foram propriamente investigadas pelo FBI e que não estavam conectadas a William Hale. E eu encontrei outros registros que realmente revelaram que tudo foi uma campanha sistemática de assassinatos." E é esse projeto genocida que o autor espera que o público entenda com o filme. "Eu percebi que isso era muito menos uma história sobre quem fez isso, do que sobre quem não fez. Era sobre essa cultura de matança e cumplicidade. Eu acho que o filme mostra isso e você tem vislumbres disso."

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Killers of the Flower Moon © Paramount Pictures

A Nação Osage no filme

Uma qualidade a ser destacada no filme é o respeito à Nação Osage durante toda a produção da obra, e o envolvimento da comunidade na criação do longa-metragem. Martin Scorsese inclusive filmou nas terras dos Osage e a grande maioria dos atores são Osage. "Eles estiveram envolvidos em todos os níveis, da produção ao figurino, garantindo que a língua Osage era falada e que os atores Osage tivessem papéis com falas. Isso foi algo notável de ver." Inclusive, a cena do conselho tribal Osage foi totalmente improvisada. O diálogo entre Yancy Redcorn e Everett Waller surgiu de uma conversa que bebeu de suas próprias experiências de vida e das narrativas orais transmitidas pelos seus antepassados. Scorsese ouviu o diálogo e fez questão de incluí-lo no filme.

Uma segunda parceria

Assassinos da Lua das Flores tem sido amplamente aclamado pela crítica e já alcançou mais de US$ 100 milhões em bilheteria no mundo todo. Resta saber se a próxima adaptação de um livro de Grann por Martin Scorsese verá tanto sucesso. O diretor e Leonardo DiCaprio recentemente adquiriram os direitos de outro livro do autor, The Wager. Sobre a segunda parceria, Grann declarou: "Foi a decisão mais fácil que eu já tomei. Não acho que o projeto poderia estar em melhores mãos."